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[Report] Japão 2023 - Parte 2 - Hiroshima e Beppu

David sf

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[Continuação deste post]

5 – Miyajima

A cerimónia religiosa no templo demora meia hora, e achei-a um pouco monótona. Durante 20 minutos o monge lê escrituras religiosas numa língua que não entendo de forma extremamente monocórdica, enquanto outro monge toca, por vezes, uma taça tibetana com tamanho de caldeirão. No final, como não poderia deixar de ser, pedem 500 ienes a quem está a assistir em troca de queimarem umas placas de madeira com os desejos de cada pessoa lá inscritos.

Tomo o pequeno almoço, extremamente semelhante ao jantar, e apanho o autocarro a caminho da estação do teleférico.



Neste dia mais uma odisseia ferroviária. Volto o caminho para trás até Hashimoto, onde apanho o comboio vindo de Oji, onde já andara na véspera, até Wakayama. Em Wakayama apanho o comboio rápido até Shin-Osaka, onde me estreio no Shinkansen, até Hiroshima. A linha entre Osaka e Hiroshima, percurso de 330km que se fazem em pouco mais de uma hora, rompe montes e vales através de intermináveis túneis e altos viadutos. Tem umas 4 estações no percurso, numa delas espantou-me um catedral ao estilo europeu.



Deixo Hiroshima para visitar no regresso, o destino é a ilha de Miyajima que se situa na mesma baía. Há ferries directos desde Hiroshima, mas o ferry incluído no JR Pass parte de uma localidade nos arredores da cidade, portanto há que apanhar um comboio suburbano até lá. A viagem dura 20 minutos.

Depois há que percorrer uns 300m a pé até ao terminal do ferry, onde os mesmos partem de 20 em 20 minutos. A viagem de ferry é rápida, menos de 15 minutos.



Havia acabado de cair um intenso aguaceiro e a temperatura desta vez não baixou, provavelmente por estar junto ao mar. Apesar de estarem uns 28 graus, foi o ambiente mais incomodativo que apanhei em toda a viagem, a humidade deveria estar muito perto dos 100%.











Não são tão em tanta quantidade como em Nara, mas também há veados à solta pela ilha.











O primeiro local que visito é o templo Daishoin.





Neste templo há várias pequenas estátuas com carapuços vermelhos. Segundo várias fontes que consultei tratam-se de homenagens e desejos de eternidade feliz a crianças que faleceram ou fetos não nascidos. Onde as fontes divergem é na proveniência dos carapuços e babetes, algumas dizem que pertenceram a essas crianças, outras dizem que se compram para colocar nestas estátuas. Dada a parecença entre todos, inclino-me mais para a segunda teoria.









 

David sf

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O templo desenvolve-se ao longo da encosta, as pequenas estátuas estão na subida, no topo está o núcleo principal do templo. Quando lá chego, o templo está quase a fechar e um dos monges dedicava-se a recolher as esmolas, uma das actividades preferidas destes monges.















Voltando para a vila, passa-se numa cascata vinda da montanha. Por causa do forte aguaceiro antes de eu chegar, o teleférico que leva ao ponto mais alto da ilha estava encerrado.





Esta é a foto mais famosa da ilha, o Torii de Itsukushima, versão maré alta. Na maré baixa, como se pode ver nas fotos tiradas desde o barco, é possível chegar a pé ao Torii.





Junto ao Torii, o santuário de Itsukushima, também em versão maré alta, na minha opinião a sua melhor versão.











Mas umas fotos da localidade.







 

David sf

Membro Conhecido
O meu jantar desse dia, com pratos típicos locais. Arroz de enguias e ostras fritas.



À noite a ilha ganha outro encanto, não só pelas lanternas a ladear o mar, mas também porque os turistas vindos da ilha principal já saíram, e o sossego é imenso. Vale muito a pena passar a noite nesta ilha.









6 – Beppu

Uns dias antes da viagem, já quando tinha tudo marcado, descobri num documentário do YouTube a cidade de Beppu. Estando completamente fora de todos os principais roteiros turísticos, tem uma grande concentração de manifestações geotérmicas, algo muito do meu agrado, pelo que decidi que tinha que lá ir.

Localizada a mais de 300 km a Oeste de Hiroshima, já na ilha de Kyushu, poderia implicar uma enorme perda de tempo, mas graças à grande rapidez e frequência dos comboios no Japão, a viagem faz-se em pouco mais de 2 horas. Deste modo é perfeitamente visitável desde Hiroshima, pelo que resolvi guardar a visita desta cidade para a manhã seguinte, ocupando este dia com Beppu.

Volto então até à estação de Hiroshima, onde deixo a mala num cofre e apanho o Shinkansen até Kokura, a primeira cidade após a entrada na ilha de Kyushu.

Esta é uma cidade afortunada, porque era o alvo da bomba atómica de Nagasaki. A nebulosidade impediu a visibilidade do alvo naquela manhã de 9 de agosto de 1945, e após uma hora a sobrevoar a cidade sem que a nebulosidade se dissipasse, o Bockscar divergiu para Nagasaki. Ainda hoje nos meios militares americanos é referida a “sorte de Kokura” para eventos de extrema sorte involuntária, como quando alguém perde um avião que acaba por se acidentar.

Há alguma polémica sobre a origem da nebulosidade, há várias teorias que provinha de um fogo resultante de um bombardeamento na véspera numa cidade vizinha e há até quem afirme que o fogo foi propositado para impedir o bombardeamento da cidade.

Com tenho cerca de meia hora entre a chegada do Shinkansen e o comboio rápido com destino a Beppu, visito a zona circuntante da estação, nesta sortuda cidade.





Após mais uma hora de comboio, chego a Beppu. Os principais pontos de interesse desta cidade, localizada no sopé de dois vulcões em actividade, estão na encosta a uns 5 km da estação, pelo que há que apanhar o autocarro até lá. O preço é de aproximadamente 2€, há um bilhete diário a 100 ienes (6,5€), mas que só compensa a partir da terceira viagem, quem fizer apenas ida e volta pode dispensá-lo.

Lá no alto, existem várias lagoas (os japoneses chamam-lhes infernos, Jigoku) de várias cores, em função do tipo de rocha que a água atravessa até à superfície. Quase todas têm entrada paga, a preços aceitáveis (aprox. 3€ cada).

Em redor dos infernos existem sempre jardins bastante interessantes.


























Num dos infernos, há uma “piscina” para os pés:

 

David sf

Membro Conhecido
A vista da cidade é impressionante, com várias colunas de vapor de água, provenientes dos infernos ou de banhos públicos, algo pelo qual os japoneses são viciados (ainda tenho de entender a razão pela qual, no verão, é apelativo ir para um local com água a ferver e humidade altíssima, é equivalente a andar na rua…).








Encontrei em algumas cidades japoneses, e Beppu foi uma delas, estes gelados revestidos a ouro. Não o provei, era um simples gelado de nata com pó de ouro, e pelo qual pedem o triplo que um gelado normal.



Volto à zona da estação, junto ao mar, e como tinha ainda meia hora, foi espreitar a costa. Sabia que nesta zona as areias quentes têm propriedades curativas, e que há pessoas que pedem para ser enterradas durante meia hora em areia a ferver, pelo que pensei que houvesse uma praia razoável e uma linha de costa arranjada, mas enganei-me. Esta zona está ao abandono, a cidade está de costas voltadas para o mar. Presumo que a causa sejam os tsunamis relativamente frequentes que o mar traz, no Japão o mar, mais que o lazer que proporciona, é uma ameaça.



Junto à estação, um estabelecimento com nome em português, que estava fechado.



E uma estátua engraçada junto à estação.



Volto então para Hiroshima, onde chego ao fim do dia.



Ainda a tempo de comer os típicos Okonomiyaki, preparados na chapa à minha frente.









7 – Hiroshima

Uma manhã para a qual é preciso preparar a alma e o estômago. Deste modo, começo com um pequeno almoço no hotel, relativamente soft para os padrões nipónicos, mas onde se inclui uma sopa.



O que há para ver em Hiroshima resume-se ao legado da bomba atómica que arrasou a cidade a 6 de agosto de 1945. Chegado ao ground zero do evento, mesmo no centro da cidade, após uma viagem de 10 minutos de elétrico, o primeiro local a visitar é o A-Bomb dome, antigo edifício da câmara do comércio da cidade, e dos pouquíssimos num raio de 1 milha do hipocentro que não foi totalmente arrasado.







Após passar pelo dome, entra-se no parque em memória das mais de 100 000 vítimas da barbárie.
As novas Rosas de Hiroshima, estas com cores e perfume.



 

David sf

Membro Conhecido
O monumento às crianças mortas, com os oregamis pela paz e a homenagem a Sadako Sasaki







O Memorial.





O Museu, e aqui há que ter estômago de aço. Este museu é extremamente gráfico, reúne fotos dos dias seguintes ao bombardeamento e desenhos feitos pelos sobreviventes. É assim que deve ser e toda a gente deveria visitá-lo pelo menos uma vez na vida, para que todos se apercebam que aquilo não se deve repetir.
Já estive em vários locais evocativos de barbáries diversas, Auschwitz-Birkenau, Srebrenica, Museu do Gulag, etc., mas este foi claramente o que mais me marcou. Num milésimo de segundo, dezenas de milhar de pessoas foram obliteradas da face da terra, transformaram-se em pó, e centenas de milhar ficaram com danos permanentes e as suas vidas tornaram-se num inferno.























Um exemplo de uma sombra nuclear. A radiação luminosa da explosão aclarou todas as superfícies atingidas, excepção feita aos locais onde no momento estavam pessoas ou animais, causando assim estas sombras nas superfícies. Este acaba por ser o último testemunho destas pessoas, que instantaneamente se terão tornado pó.



Fora do museu, uma exposição de homenagem ao serviço de meteorologia da cidade, que mesmo com todos os problemas, monitorizou o tufão que um mês depois da barbárie atingiu a cidade.



E várias outras homenagens:



 

David sf

Membro Conhecido
E a zona do hipocentro, onde a bomba explodiu a cerca de 600m de altitude.



Regresso de elétrico até à zona da estação.





Onde recolho a mala no hotel e almoço, antes de apanhar o Shinkansen a caminho de Shin-Osaka.





De Shin-Osaka apanho o comboio até Kanazawa, o maior percurso de todas as férias, quase três horas.
 

ploferreira

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Staff
Olá!

Obrigado por mais esta partilha, sem dúvida que Hiroshima deve ser uma experiência marcante!
Vou continuar a acompanhar a aventura, que vênha a parte 3.
 

PaulaCoelho

Membro Conhecido
Gostei muito desta continuação, Miyajima é um local bem bonito :)
Sem dúvida que a visita a Hiroshima deve ser algo emocionalmente pesado.
Quando andei a fazer o meu roteiro pesquisei Beppu mas pus de parte pois pareceu um pouco desviado, afinal fica a 3h de comboio.

Tenho muita curiosidade na parte alpina que se segue!
 

Sandro Trigo

Membro Conhecido
David, geralmente as grandes tragédias possuem uma sensação de imensa angústia mas ao mesmo tempo de alguma curiosidade mórbida e a de Agosto de 1945 é uma delas, ou seja, as bombas atómicas que arrasaram a área de Hiroshima e Nagasaki !!!

Volto a repetir, que interessante reportagem !!!
 
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